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Words Challenge 2020 - Presente

Hey cupcakes! Como vocês já sabem, eu e a Alê do blog Estante da Alê anualmente preparamos com muito carinho um desafio de palavras durante o ano todo, onde podemos nos desafiar e trazer um texto diferenciado no conteúdo dos nossos blogs.

O ano escolhido foi 2020, o presente. Fizemos uma troca justa por um período conturbado e bem... Construímos histórias apaixonantes e que podem muito bem ser reais nos dias de hoje. 
Continue lendo para conferir e não deixe de conferir também no Estante da Alê! 😍

Desafio Outubro/2020

Palavras: desenho, hipótese, romã, jardineira, nariz e bolo.

Vejo a massa sovada rodar e rodar em minha mão. Só percebo que estou concentrado mais que o suficiente no ato quando vejo cada centímetro que a farinha misturada à água, fermento e outros ingredientes geraram naquele pedaço que se tornaria pão. O trigo começa a despontar a alergia na minha pele, então deixo a massa descansando e a cubro com um pano enquanto volto a me concentrar na panela fumegante.

Lavo as mãos e passo o antisséptico antes que a minha pele pipoque outra vez. Quem diria, um chef que ama fazer pão, tem alergia à trigo. Se eu contasse, ninguém acreditaria, é claro.

O molho bolognese está quase pronto, mas acrescento algumas ervas finas. Sinto o aroma do molho béchamel, mexendo mais um pouco antes de  desligar o fogo. O preparo precisa ser rápido no restaurante, mas a necessidade de ser tudo sempre fresco me delicia mais do que poderia confessar para qualquer cliente – o prazer de cozinhar impregna na minha pele mais do que qualquer coisa que eu posso preparar. Me fascinam os temperos, os sabores, a explosão na língua, a expressão admirada das criações. Eu sempre me escondo atrás da porta bangue-bangue para observar a cara que os clientes fazem quando escolhem algum prato que eu gosto especialmente.

É maravilhoso poder proporcionar uma sensação de incredulidade e sabor na expressão das pessoas. Enquanto escorro o tagliatelle e o spaghetti em uma tigela, recheio os cannolis no balcão e finalizo o prato, deixando para dois garçons que entram neste momento. Um pega os pratos e os leva com cuidado aos seus novos destinatários, e a segunda me olha com os mesmos olhos com que vejo há dois anos. Tento ignorar o redemoinho que se forma com a mera hipótese de convidá-la para sair após o expediente que acaba tarde, por volta das três ou quatro da manhã.

Ela me devolve um sorriso sem dizer absolutamente nada. Sei o que o cheiro do pão que preparo para a noite italiana faz com o estômago dela, me disse uma vez. Ela pega os pratos, equilibrando-os e sai, com o mesmo andar divertido de sempre. Ela é tão natural e espontânea que eu não posso deixar de achar isso inevitavelmente sexy. Ela não usa roupas apertadas, mas deixa o suficiente para minha imaginação entender mais do que deveria. E assim, só de vê-la por um instante, quase deixo o molho literalmente ferver além do ponto, no fogão ao meu lado.

Vejo que a noite vai ser mais longa do que o esperado... Outra vez. 
* * *
E cá estou eu, observando-o de um ângulo que os outros clientes não podem ver. Estou escondida na escada da cozinha, que leva para fora. Ninguém pode ver meus pés, pois a jardineira está aqui há algum tempo, e graças a Deus, ninguém se deu o trabalho de tirá-la daqui. Sorte a minha, não? Sento um degrau abaixo e prendo a respiração enquanto vejo-o terminar o último pedido da noite: a torta de romã com chocolate, ou, como está no cardápio, a torta do amor.

Essa torta é o nosso carro-chefe das sobremesas e já se tornou conhecida na cidade por antecipar, no pedido, que geralmente vem escondido por um sussurro para nós, algum bom agouro de relacionamento: já vi pedidos de namoro, casamento, casar outra vez com a mesma pessoa, reconciliamento de amizades e outros tantos perdões e desejos estampados no brilho dos olhos de muitas pessoas que passaram por aqui. Como se fosse a cereja do bolo, ele derrama a cobertura de chocolate na fatia e deixa o prato impecável assim que Tadeu entra para buscá-lo. Ele começa a limpar e corta outra fatia para si, deixando-a separada no prato à parte.... Será que está esperando alguém?

Ele coloca os pratos no lava-louças assim como os talheres e embrulha com papel alumínio, colocando na geladeira a minha sobremesa favorita - isto é, desde que ele nos fez experimentar sua nova criação. Antes disso, era o brownie de chocolate meio amargo com cobertura de morango flambado. Ele começa a cantar e, pela primeira vez, reviro os olhos, inquieta. Me levanto para ir embora e cancelar todos os planos que eu havia feito para essa noite, mas sem querer esbarro na jardineira, que está cheia de terra e desce a escada quicando, mas pela graça de Deus, permanece intacta em sua estrutura.

Ao menos uma notícia boa.

A ruim é que tenho olhos castanhos cor de chocolate olhando pra mim, com o óculos na ponta do nariz e um sorriso de lado  com a expressão facial que mais gosto. Aquela que diria "O que você aprontou dessa vez, Miriam?". Gosto tanto que poderia emoldurá-lo num desenho na parede do meu quarto, para vê-lo antes de dormir todos os dias...

— Eu pensei que você tinha ido embora, Miriam. —  Ele denota, colocando o pano que estava secando o fogão nos ombros e cruzando os braços... Essa pose, não. O sorriso se torna divertido cada segundo que passa.

— Estamos em pleno 2020 e você achou que eu não iria esperar para tirar o lixo? Muito inocente, sr. Bezukhov. —  O apelido que dei, quando descobri que ele gostava de ler Tolstói.

Ele riu e se virou para o fogão.

— Ei... Eu queria te fazer um convite.

Ele me olhou por cima do ombro.

— Uma fatia de pão quente?

Engoli em seco e segui em frente. Já tinha o não de qualquer forma.

— Bem... Se você quisesse fazer isso, tomando um cappuccino fora do expediente comigo, por que não?

Ele tirou o pano do ombro e voltou-se completamente pra mim.
O quê?

— É... Eu estou te convidando para sair, se você quiser. Se você não quiser... Eu... Eu... Tudo bem. E se você tiver namorada, realmente me desculpe, eu só...

Ele virou de costas e abriu a geladeira, resgatando o prato que eu o vi guardar lá dentro.
A torta do amor olhava para mim, ainda mais apetitosa do que antes. Ele tirou o papel alumínio.

— Eu... Pensei que você tivesse ido embora, guardei para quando estivesse aqui outra vez. —  Ele sorriu e pude ver as bochechas corarem. Deus do céu... —  Se você não me pedisse, eu iria te convidar. Considere a torta um "sim" para sua resposta, mas...O que acha de comê-la comigo agora? —  Ele me entrega um garfo. —  E a fatia de pão quente com café, pode ser hoje mais tarde visto que já passou da meia-noite... Que tal?

Pego o garfo dele e dou um sorriso.
Como eu poderia dizer não?

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22 Comentários

  1. Oi, Pâmela como vai? Menina o texto ficou incrível, parabéns! Adoraria ler uma obra sua publicada, pois você escreve muito bem. Gostei bastante do texto. Abraço!

    https://lucianootacianopensamentosolto.blogspot.com/

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    1. Oie!!! obrigada Luciano ♥ muito bom ler comentário como o seu!!!
      fiquei muito feliz!!

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  2. Oi.
    Acabei de vir de lá e gostei muito do seu texto também . Ficou impecável e gostei muito das palavras escolhidas.
    É uma forma de aguçar a criatividade e treinar a escrita criativa.
    Beijos.



    https://www.parafraseandocomvanessa.com.br/

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  3. Oi, Pamzinha!

    Ahh que demais, adorei!! Não canso de falar que você escreve super bem, cadê um livro autoral?? Já quero!!

    xx Carol
    https://caverna-literaria.blogspot.com/

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  4. Adorei Pam! Ficou realmente muito bom, gosto do jeito que vc escreve. Beijos!

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  5. Vendo esses textos, eu penso nos que estão por vir e só fico com mais vontade de escrever! Como isso vicia, né? kkkkk
    Orgulho demais! ♥
    beeeijos Pamzinha
    http://estante-da-ale.blogspot.com/

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  6. Oi Pâm, tudo bem?
    Meu Deus, que fofo esse casal. ♥
    Amei a ambientação e todas as alegorias à cozinha, ao processo de cozinhar. Ficou muito legal esse conto!
    Beijos,

    Priih
    Infinitas Vidas

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  7. Boa tarde Pâm. Não esquece do meu autógrafo. Parabéns pela inspiração.

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  8. Nossa, o texto ficou incrível, parabéns. Você escreve muito bem, se lançasse um livro, com certeza eu leria.

    𝐀𝐦𝐚𝐢 𝐃𝐨𝐤𝐮𝐬𝐡𝐨

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  9. Amei o texto. Esse desafio é tão incrível e eu amei como as palavras foram encaixadas
    beijos
    https://www.dearlytay.com.br/

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  10. Olá,
    Ficou o ótimo jogo com as palavras.
    E o texto muito fluído... me deixou com fome. haha

    tenha uma ótima semana :D
    Nana - Canto Cultzíneo

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  11. Oi, Pânzinha

    Ahhhhhhhh tinha que ter culinária no meio, né? MUITO sua cara mesmo, eu amei. Bateu até vontade de comer um macarrãozinho aqui! hahahahaha
    Seria meu sonho ter um momento fofo assim numa cozinha? Cadê meu namorado pra fazer isso? Só aparece pra beliscar as coisa, mané! hahahahah

    Beijos
    - Tami
    https://www.meuepilogo.com

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    Respostas
    1. Oie Tami!!!!

      SIMMMMMMMMM
      tinha que ter um cozinheiro KKKKKKKKKKKKK
      obaaaaaaaa
      ensina ele a fazer fatia húngara, Tami!!! kkkkk

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